A exposição “Cesariny, Cruzeiro Seixas, Fernando José Francisco - e o passeio do cadáver esquisito”, reúne obras originais, realizadas entre 1941 e 2006 - ano em que realizaram um conjunto inédito de 12 “Cadavres Exquis”, utilizando o processo desenvolvido pelo Grupo Surrealista de Paris, liderado por André Breton, no início do Séc XX. Marca, ainda, o reencontro destes três artistas, hoje octogenários, após 55 anos de afastamento. Algo que, de per si, serve como exemplo de vitalidade criativa e sentido artístico. E vem provar que a "Revolução Surrealista", proposta por André Breton no 1º Manifesto Surrealista (1924), continua sendo a pedra de toque dos artistas que, em Portugal, abraçaram o Surrealismo na década de 40. Mais: mostra que, apesar dos que tentam silenciar esta funda necessidade de expressão, subconsciente em estado puro num processo de automatismo psíquico (e emocional), esta proposta de revolução permaneceactual, por |
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libertadorae pacífica mas, sobretudo, por se enquadrar no campo das legítimas aspirações do indivíduo, especialmente quando confrontado com a ditadura da pseudo-vontade das massas. | |||
Dos três autores que agora expõem, Fernando José Francisco será o menos divulgado junto do grande público (muito pelo facto de se ter afastado, voluntariamente, dos circuitos artísticos sem que, com isso, deixasse de pintar), contudo é considerado por Mário Cesariny e Cruzeiro Seixas, desde há muito tempo, como o mais talentoso e promissor artista do grupo de autores que se juntaram em “Os Surrealistas” ( 1ª Exposição no salão da Pathé Baby, Lisboa, em 1949 ). Pretendemos, com esta mostra, contribuir para dar visibilidade a autores que são fundamentais na criação contemporânea em Portugal e que, com o seu labor iniciado ainda na primeira metade do séc. XX, contribuíram de forma ímpar para abrir caminho a novas expressões e linguagens, factos mais do que reconhecidos dentro e fora do meio artístico. Sobretudo quando se atende ao valioso trabalho em prol da liberdade criativa. | |||
A esse respeito, destaca--se aqui a colaboração generosa de três dos mais respeitados críticos de arte, através de textos que integram o catálogo da exposição. A saber, João Lima Pinharanda, Eurico Gonçalves e Perfecto E. Quadrado. | |||
Por tudo isto parece-nos de inteira justiça prestar homenagem a estes artistas, em vida, sobretudo numa altura em que, apesar de todos terem passado a barreira dos oitenta anos de idade e de as condições físicas não serem as melhores, se juntaram, após décadas de afastamento, para realizarem na Perve Galeria uma tão maravilhosa exposição. O passeio dos cadáveres – da Costa da Caparica à Praça Pasteur A ideia de fazer uma exposição que reunisse os três fundadores de “Os Surrealistas” surgiu, mal comparando, como a maçã a Isaac Newton. Eles, Cesariny e Cruzeiro Seixas, haviam dito inúmeras vezes, cada um à sua maneira, que “de entre todos, o Fernando José Francisco, era o melhor”, o que mais prometia vir a ser um grande artista mas que “para casar, teve de largar a pintura e arranjar um emprego a sério” e desapareceu. |
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Não mais se reuniram. Ouvia-os em separado e não fiz caso. Até que um dia, a maçã, ou melhor, a evidência acertou-me em cheio. | |||
Estava a editar os documentários que fiz sobre eles e, a dada altura, foi como se uma luz se acendesse ao fundo, não do túnel, do labirinto. Tanto o Cruzeiro Seixas como o Cesariny, que tanto discordam acerca de tudo ou quase, diziam exactamente a mesma coisa: “O Fernando era o melhor”. Fiquei transtornado por o não haver pensado logo e decidi, nesse instante, procurar saber mais e, se possível, conhecer pessoalmente o Fernando José Francisco. Não foi nada fácil mas valeu a dificuldade pois o primeiro quadro que vi em casa dele (“Ecce Homo”) confirmou a suspeita de haver pintura séria, feita de verdade e surrealismo. Comecei por perguntar--lhe se queria fazer uma exposição. Disse-me não. Voltei, passados dias, tornando a insistir. Não, que estava velho e doente, ouvia mal, via pior e sofria de asma crónica desde sempre. E eu a fazer-lhe ver que era importante sair da concha. Não. E daí a tempos: sim, quando lhe falei do projecto a três. Olhos iluminados, quando diz “com os meus amigos, gostava”. | |||
Isto, claro, só possível por primeiramente haver falado com os amigos dele e meus. Que me deram um sim munido de avisos de obra difícil: “o Fernando talvez não tenha voltado a pegar nas tintas e não haja nada” ou “talvez ele não queira voltar a expor”. | |||
Mas, se ele quisesse, “seria maravilhoso” (C. Seixas) e “única razão para voltar à pintura” (Cesariny). Ficou estabelecido. Iria haver exposição. Só tinha de tratar do resto. Não era pouco. Entretanto veio a ideia de celebrar o reencontro com “cadáveres esquisitos”. Como não se sentiam com energia para encontros (custa tudo, desde o andar ao falar), poderia haver trabalho de grupo sem o grupo se reunir. Eu faria de estafeta e trataria de levar os cadáveres a passear (Verão, praia) à Costa da Caparica, ao encontro com Cesariny. Lá ficaram, à espera do toque afectuoso. Depois de completada a parte de um, logo tratava de a tapar, deixando apenas visíveis as pontas das linhas que outro se encarregaria de continuar. Entretanto, havia sido combinado que cada um iniciaria o mesmo número de cadáveres e, volta e meia, o número aumentava. Chegou aos doze e são magníficos. Apóstolos fieis e cumpridores: celebram a trilogia Surrealista de Liberdade, Amor e Poesia. Pude observar, por entre as dificuldades da octogésima casa solar ou lunar, que a arte não se extinguirá enquanto houver gente assim. Nem depois. Estas obras permanecem, para lá de nós. Artur, Fernando e Mário: Obrigado por essa dádiva e pela confiança que depositaram nesta Galeria. Tentaremos sempre ser merecedores desse vosso gesto. Fica a promessa. Carlos Cabral Nunes | Direcção Artística |
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| Cadáveres Esquisitos - Súmula | |||||||||||||||||||||||
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