Trata-se de uma exposição, de carácter retrospectivo,
da obra de Manuel Figueira, natural da ilha de São Vicente, em
Cabo Verde. São apresentadas 126 obras, desenho e pintura sobre
papel e platex, do período compreendido entre 1963, anterior à
sua viagem para Portugal, onde viveu entre esse ano e 1974, tendo frequentado
o Curso Complementar de Pintura da Escola Superior de Belas Artes de Lisboa,
até obras recentes datadas de 2004. É uma exposição
tanto mais importante porque dá a conhecer aquele que é,
provavelmente, um dos expoentes máximos da arte e cultura de Cabo
Verde, tendo sido responsável, entre muitas outras coisas, pelo
desenvolvimento da Cooperativa Resistência (1976) e, posteriormente
(1978-1989), pelo Centro Nacional de Artesanato, onde fez investigação
sobre o processo de tecelagem tradicional de Cabo Verde e revitalizou
esta técnica criando e desenvolvendo trabalhos artísticos
especificamente para esse suporte.
O mote da exposição
- Visões d'Infinito - pretende a sugestão reflexiva entre
obra e vida do autor, numa dinâmica de relacionamento entre as épocas
em que os trabalhos foram feitos e os caminhos, locais, sonhos e desafios
que se colocavam (e colocam ainda) a Manuel Figueira, sobretudo naquilo
que lhe é mais particular e que, afirma, continua a ser o seu caminho:
"a utopia e o colectivo", como elementos potenciadores de uma
sociedade infinitamente melhor, em estado de arte.
Sobre o autor, refira-se que tem realizado exposições individuais
e participado em mostras colectivas,ininterruptamente, desde 1963, em
países como Portugal, E.U.A., Bélgica, Espanha, França,
Brasil, Áustria e, naturalmente, Cabo-Verde. A sua obra está
representada em inúmeras colecções públicas
e privadas de diversos países, com destaque para as peças
incluídas nas colecções do Museu de Ovar, Banco Fomento,
Banco Totta & Açores, A.N.P. (Cidade da Praia, Cabo Verde),
Embaixada de Cabo Verde para a ONU (Nova Iorque) e palácio da Cultura
(Cabo Verde). Em 1988, foi galardoado com o Prémio Jaime Figueiredo
(Ministério da Cultura e Desportos de Cabo Verde) e em 2000 foi
agraciado com a "Medalha do Vulcão", condecoração
atribuída, por ocasião do 25º Aniversário da
Independência de Cabo Verde, pela "Importante actividade nas
áreas da pintura e do artesanato e sua louvável dedicação
à pesquisa e ao magistério".
Sendo esta a primeira exposição retrospectiva, deste admirável
autor, realizada em Portugal, estamos convictos que se trata de uma oportunidade
irrepetível para a descoberta da singularidade contida na linguagem
encantatória de Manuel Figueira, aqui reflectida por múltiplas
Visões d’Infinito.
Cabral
Nunes | Perve Galeria
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Das
histórias de Cabo Verde, pintadas por Manuel Figueira
São
histórias das dez ilhas. As histórias estão aqui
narradas nas obras de Manuel Figueira, obras essas que do atelier, em
São Vicente, vieram “morar” agora numa Galeria situada
entre as ruas, estreitas e antigas, da colina mais histórica de
Lisboa, a Lisboa deste pintor nos anos sessenta, a do tempo de estudante
da Escola de Belas Artes, dos seus combates e sonhos cívicos, utopias
e solidariedade por um novo mundo que hoje, mais do que nunca, se interroga,
ou se parece esvair, noutros princípios e desejos de realização.
Mas estas obras de Manuel Figueira são talvez mais histórias
de uma ilha única de capital Mindelo, onde o pintor vive, trabalha,
escuta, observa, imagina, relembra, critica e reconstrói - pela
sua memória tão rica - as realidades das pessoas e dos factos
que irá transpor para as suas obras, algumas delas antes esboçadas
em desenhos minuciosos, com pormenores de personagens e situações
que irão ser depois temas privilegiados, tais como “Antónha
d’Ia”, “Urinando em desafio”, “Quês
dôs crióla e três cueca” e “Jonsóna-O/A
Hemafrodita”.
Estóreas da Morada, poderia Germano Almeida intitular um dos seus
livros que também só se poderia ambientar no Mindelo, cidade-paradigma
da vida cultural crioula, histórias que, por vezes, Manuel Figueira
incorpora num fantástico entre céu e terra, (ex: “Aquele
fantástico Carnaval: cabras, bois alados, músicacórnea
e Narciso”) que nos envolve e prende com “narrações”
pintadas em cores do azul e verde do mar, do amarelo e do ocre da terra,
às vezes quase avermelhada, das cores das cinzas do vulcão
que, na ilha do Fogo, é sentinela telúrica do que vem da
terra e na terra fica.
Da sua terra é também alguma temática da pintura
de Manuel Figueira, testemunha ímpar do percurso de pioneiro na
recuperação cultural de um património de artesanato,
do qual, com poucos outros companheiros, foi protagonista, após
a Independência do seu país, recuperação hoje
tão mal compreendida e abandonada, apenas por quem teima em esquecer
ou ignorar uma realidade. Títulos como “Nhô Griga os
liços e a urdidura”, “Nhô Griga tecendo o seu
calabêdótche multicolo”, são presença
evocatória dessa profunda cultura cabo-verdiana, como também
são presenças da mesma cultura, embora numa vertente literária,
as ilustrações que Manuel Figueira foi realizando para a
obra poética de Francisco Fragoso (Kwame Condé), para o
Poema do Capitão Ambrósio de Gabriel Mariano ou ainda para
poemas de Osvaldo Alcântara, apenas para citar algumas.
Escrever em poucas linhas sobre um pintor e a sua obra não nos
acontece todos os dias. São atribulados caminhos de síntese
em que tudo nos parece ficar por dizer, corre-se o risco de soletrarmos
uma tabuada de lugares comuns, mesmo assim pouco inteligível para
os visitantes. Melhor será que esta exposição seja
vista, sobretudo, como a revelação de um momento excepcional
cabo-verdiano para o público português, revelação
de desígnios e de interpretações, de desencontros
e de encontros nos incidentes humanos das histórias das ilhas,
onde tudo se acha do que nos acontece entre um crepúsculo no mar
e um cais de porto, ilhas onde a beatitude é um privilégio
da noite e da cumplicidade de estrelas candentes, que são depois
os destinos de todos nós, iluminados e fugazes, antes que alguém
os retenha e os explique como o faz Manuel Figueira nas suas obras.
João
Nuno Alçada
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Ficha
Técnica
Exposição
Comissário:
Cabral
Nunes
Assistência
na Montagem: Nuno
Espinho da Silva e Nicolas Defraiteur
Promoção e Divulgação: Nuno
Espinho da Silva
Catálogo | Site: Cabral
Nunes
Colaboração
| Agradecimentos: João
N. Alçada, Luisa Queiroz e Sérgio Figueira
NOMA
- VideoDoc #07| Manuel Figueira
Realização
| Captação Audiovisual:
Cabral
Nunes
Edição
Vídeo | Pós-produção: Nicolas
Defraiteur
Edição
Áudio:
Sérgio
Henriques
Produção:
Nuno
Espinho da Silva
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